Acesso a dados pessoais sem autorização judicial e o Brasil na contramão da Sociedade da Informação

Conforme noticiado pelo O Estado de São Paulo, a Advocacia-Geral da União prepara parecer que pode ter o efeito de autorizar o acesso a dados pessoais pelo Ministério Público Federal, as promotorias estaduais, a Controladoria-Geral da União, a Polícia Federal e o Tribunal de Contas da União – sem necessidade de autorizacão judicial para tal.

A medida é fundamentada, como costuma ser em tais casos, nas necessidades do combate à criminalidade.A privacidade e o sigilo, em suas diversas formas, são apresentados como subterfúgios para acobertar ações ilícitas. Ao menos no discurso, parece prevalecer uma tese há muito abandonada em diversos países que, com o passar dos anos, amadureceram suas regras de proteção de dados de uma forma balanceada: a de que um homem honesto não teria nada a esconder.

A questão que parece descurada neste e em outros debates do gênero é de que o elogio da transparência é um mero efeito retórico. O acesso às informações pessoais na Sociedade da Informação é uma das modalidades fundamentais de distibuição de poder. O fato de uma pessoa zelar pelos seus próprios dados, procurar saber para que e por quem serão utilizados, não é um metro da sua honestidades pessoal pois todos, a prescindir da honestidade pessoal, podem ser afetados por utilizações abusivas de suas informações pessoais. Até o ponto que esta distribuição continuar a ser feita ao arrepio de direitos fundamentais da pessoa em relação ao controle de suas própias informações – o que era possível, no caso, pelo controle jurisdicional da quebra do sigilo – a balança pende mais e mais a desfavor da pessoa.

Destaque-se que a Receita Federal, que eventualmente teria a ganhar com a medida, manifestou-se contrária a ela. Pode-se, em um pequeno esforço de imaginação, tentar-se supor o porque: talvez, tendo vivenciado os resultados de procedimentos que ampliam a utilização e o acesso a dados pessoais, está mais do que todos consciente que esta atividade é uma atividade de risco, cujos resultados acabam sendo, infelizmente, o vazamento e a perda de controle sobre os mesmos. A prejuízo do cidadão.