Conforme noticiado pelo O Estado de São Paulo, a Advocacia-Geral da União prepara parecer que pode ter o efeito de autorizar o acesso a dados pessoais pelo Ministério Público Federal, as promotorias estaduais, a Controladoria-Geral da União, a Polícia Federal e o Tribunal de Contas da União – sem necessidade de autorizacão judicial para tal.
A medida é fundamentada, como costuma ser em tais casos, nas necessidades do combate à criminalidade.A privacidade e o sigilo, em suas diversas formas, são apresentados como subterfúgios para acobertar ações ilícitas. Ao menos no discurso, parece prevalecer uma tese há muito abandonada em diversos países que, com o passar dos anos, amadureceram suas regras de proteção de dados de uma forma balanceada: a de que um homem honesto não teria nada a esconder.
A questão que parece descurada neste e em outros debates do gênero é de que o elogio da transparência é um mero efeito retórico. O acesso às informações pessoais na Sociedade da Informação é uma das modalidades fundamentais de distibuição de poder. O fato de uma pessoa zelar pelos seus próprios dados, procurar saber para que e por quem serão utilizados, não é um metro da sua honestidades pessoal pois todos, a prescindir da honestidade pessoal, podem ser afetados por utilizações abusivas de suas informações pessoais. Até o ponto que esta distribuição continuar a ser feita ao arrepio de direitos fundamentais da pessoa em relação ao controle de suas própias informações – o que era possível, no caso, pelo controle jurisdicional da quebra do sigilo – a balança pende mais e mais a desfavor da pessoa.
Destaque-se que a Receita Federal, que eventualmente teria a ganhar com a medida, manifestou-se contrária a ela. Pode-se, em um pequeno esforço de imaginação, tentar-se supor o porque: talvez, tendo vivenciado os resultados de procedimentos que ampliam a utilização e o acesso a dados pessoais, está mais do que todos consciente que esta atividade é uma atividade de risco, cujos resultados acabam sendo, infelizmente, o vazamento e a perda de controle sobre os mesmos. A prejuízo do cidadão.
O grande problema, especialmente no Brasil, é que há uma crença fanática que acesso a mais e mais informações combaterá o crime como se saber a identidade de todo mundo fosse arma de combate ao crime; se isso verdade fosse, países como Canadá e Irlanda seriam antros de criminalidade e países como Colômbia e África do Sul, paraísos terrenos onde criminalidade é apenas um conceito.
A questão principal não é o combate ao crime per se mas sim o controle das pessoas, ainda mais num país onde o serviço público é utilizado para fins escusos. Além da idéia de Toffoli ser uma afronta ao direito à privacidade e a presunção de inocência.
Mudando de pato para ganso: qual tua opinião sobre as investidas do senador Eduardo Azeredo sobre a internet, por meio de substitutivo aos PLS 76/2000 und so weiter?
Doneda,
Chegaste a ler o relatório “Leading surveillance societies in the EU and the World 2007” do EPIC e da Privacy International? Pela primeira vez analisaram o Brasil, e como é de se esperar, a nota do Brasil no campo da privacidade não foi nada boa.
O link para o relatório é http://www.privacyinternational.org/article.shtml?cmd%5B347%5D=x-347-559597