Não demorou muito. O Departamento de Estado norte-americano doou 4 aparelhos conhecidos como body scanners, capazes de “ver” através das roupas de uma pessoa, para pretensamente aumentar a segurança nos procedimentos de embarque em aeroportos.
Os 4 aparelhos, segundo matéria de [O Estado de S. Paulo], serão instalados nos aeroportos internacionais do Rio de Janeiro, São Paulo, Recife e Manaus.
Os aparelhos serão operados pela Polícia Federal.
A referida reportagem, ao levantar questionamentos sobre a invasão de privacidade dos passageiros pelo uso de tais aparelhos, obteve da Polícia Federal o esclarecimento de que:
(…) a imagem – gerada a partir da radiação emitida pelo equipamento, como uma radiografia – só tem capacidade de mostrar ossos, órgãos, objetos estranhos e o contorno do corpo dos indivíduos.
Devemos imaginar, portanto, que a Polícia Federal tem uma concepção bastante restrita do que seja a nossa privacidade, já que, para ela, “ossos”, “órgãos”, e o “contorno do corpo dos indivíduos” não seriam aspectos desta nossa privacidade.
No entanto, a declaração que mais chama – tristemente – a atenção é a do superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro, Ângelo Goia, para quem:
“Nunca há excesso quando se fala de segurança.”
Mesmo conhecendo e respeitando o trabalho da Polícia Federal, uma declaração do gênero deve despertar a atenção de todos os brasileiros e colocar-nos em alerta contra o componente fortemente policialesco e autoritário que se revela.
O mesmo Ângelo Goia prossegue em sua elegia das novas máquinas:
“Esta técnica seria menos invasiva que outras que já estão em vigor, mais constrangedoras”
É um direito nosso saber no que consistem exatamente tais técnicas, que seriam mais invasivas e constrangedoras do que despir virtualmente um indivíduo e possibilitar que a sua imagem seja utilizada para fins incertos – já que o armazenamento das imagens foi assunto no qual não se tocou.
À parte o fato de que a própria eficácia de tais aparelhos é, no mínimo, contestável, algumas perguntas básicas que são essenciais para determinar o nível de privacidade os passageiros podem esperar caso forem submetidos à revista pelo scanner, devem ser respondidas. Elas são:
- Os funcionários que terão acesso às imagens do corpo dos passageiros serão os mesmos que eventualmente o interpelarão pessoalmente?
- As imagens obtidas desta forma serão armazenadas na memória da máquina, de forma a que possa ser retirada, associada ao passageiro e utilizada para outros propósitos?
A segunda pergunta é particularmente relevante pois, nos Estados Unidos, uma entidade de defesa da privacidade, a EPIC, recentemente obteve acesso a documentos governamentais que atestam que o governo norte-americano possui armazenadas ao menos 2000 imagens obtidas de body scanners – isto após o próprio governo ter afirmado publicamente que estes aparelhos não eram capazes, tecnicamente, de armazenar imagens.
Os body scanners norte-americanos foram encomendados com capacidade de armazenamento em um HD interno, com saída USB e Ethernet, possibilitando, portanto, não somente o armazenamento como a eventual obtenção de imagens por funcionários ou terceiros não autorizados a tal. Os aparelhos que chegaram ao Brasil, provavelmente, compartilham das mesmas especificações.
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