Há 35 anos – Safari, ou a caça aos franceses

No ano de 1974, a França preparava-se para colocar em operação o sistema SAFARI – Système automatisé pour les fichiers administratifs et le répertoire des individus. Este sistema consistia, basicamente, na criação de um grande banco de dados com informações de todos os cidadãos franceses, permitindo a sua interconexão – iniciativa similar a outras tentativas de criação de um registro único de identidade, como o Registro Único de Identidade Civil (RIC) no Brasil .

Um artigo do jornal Le Monde em 21 de março de 1974 deu publicidade ao projeto, deixando claros os riscos às liberdades individuais e ao equilíbro dos poderes políticos que o projeto representava. A partir de então, ele passou a enfrentar forte oposição popular. O projeto SAFARI, por fim, acabou por jamais ver a luz do dia.

A movimentação popular fez com que o tema da proteção de dados passasse a ser visto com maior atenção e acabou resultando na lei de proteção de dados francesa de 1978 (Loi informatique et libertés) e na criação da agência francesa de proteção de dados, a CNIL (Commission nationale de l’informatique et des libertés).

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Positivo para os bancos?

O Projeto de Lei que trata do cadastro positivo – que, em suma, permite aos bancos de dados de proteção ao crédito armazenarem e utilizarem informações sobre dividas regularmente pagas, e não apenas sobre os inadimplementos – foi aprovado na Câmara dos Deputados no dia 19/05/09, seguindo agora para o Senado.

O jornal O Estado de São Paulo tornou pública, em editorial sobre o assunto, sua crítica sobre o projeto. A redistribuição de poderes que o projeto proporciona foi tratada às claras: o projeto permite ao mercado financeiro um maior conhecimento objetivo sobre o consumidor, sem dar em troca mais do que uma garantia genérica de eventual baixa dos juros para o consumo.

Um ponto que não foi tratado diretamente porém se infere do texto é o risco que a implementação deste projeto apresenta – risco este assumido praticamente de forma integral pelo consumidor, que fica mais vulnerável à medida que mais dados seus são processados e armazenados, aumentando as chances de utilização indevida e ilícita dos mesmos.

Congresso Internacional de Proteção de Dados – Bogotá

Será realizado no dia 26 de Maio em Bogotá, na Universidad de Los Andes, o Congresso Internacional de Proteção de Dados. Após a aprovação da sua lei de Habeas Data em 2008, as discussões em torno do sua aplicação tornaram-se intensas (vide o site www.habeasdata.org.co/).

O evento, organizado por Nelson Remolina, contará com a presença de Artemi Rallo (Espanha), Danilo Doneda (Brasil), Ana Brian (Uruguai) e Eduardo Campos (Portugal), além de convidados colombianos

Maiores informações

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Proteção de dados em Serviços de Atendimento ao Consumidor

O Decreto 6.523/08, que ficou conhecido como a “Lei do SAC”, traz dispositivos que tratam diretamente da proteção dos dados do consumidor que utiliza tais serviços, além de outras previsões (como por exemplo um limite de 60 segundos para que um atendente responda a uma chamada telefônica ao serviço).

Pelo Decreto, os dados pessoais do consumidor são considerados sigilosos e a sua utilização deve atender ao princípio da finalidade, i.e., “utilizados exclusivamente para os fins do atendimento” (art. 11).

Também menciona-se que o sistema informatizado deve zelar pela segurança das informações – o que incluiria as informações pessoais.

Por outro lado, há previsões cujo efeito pode ser o de aumentar o volume de dados pessoais tratado por sistemas do gênero. O registro da conversa telefônica entabulada entre o consumidor e o atendente é considerado obrigatório, bem como a sua manutanção por um prazo de 90 dias. Também o registro das interações em si há de ser mantido por 2 anos, “à disposição do consumidor e do órgão ou entidade fiscalizadora”.

O voto eletrônico é inconstitucional. Na Alemanha.

O Tribunal Constitucional Alemão determinou, em sentença de 3 de marco de 2009, a inconstitucionalidade do sistema de votação eletrônica utilizado há 10 anos no país.

A sentença identificou como maior problema no voto eletrônico a falta de transparência e respeito à natureza pública das eleições, dado que o eleitor estaria obrigado a confiar de forma quase cega à tecnologia utilizada para a votação e escrutínio.

O Tribunal considerou que, ao contrário do voto tradicional, no qual eventuais manipulações e fraudes são mais raras e difíceis de realizar por envolverem maior grau de risco e serem de mais fácil detecção, eventuais erros de programação ou uma fraude deliberadamente realizada por alguém com acesso aos programas ou às maquinas de votação somente pode ser detectada com muito esforço. Além disso, os eleitores deveriam ter condições de verificar pessoalmente a forma pela qual seu voto é registrado, sem que possuam um conhecimento técnico mais apurado.

A notícia chega no mesmo momento em que vários outros países dão um passo atrás em relação à adoção do voto eletrônico – após ter adotado o e-vote, a Irlanda acaba de decidir voltar ao antigo sistema e realizar as próximas eleições com a cédula de papel, assim como o fez em 2007 a Holanda e alguns estados norte-americanos

. Um artigo na revista Newsweek dá conta de uma tendência real à rejeição de urnas eletrônicas pelos países europeus.

O Estado de São Paulo já tem a sua “Do-Not-Call List”

Consumidores residentes no estado de São Paulo podem registrar seus números telefônicos em uma lista administrada pela Fundação Procon-SP para que não sejam importunados com ligações de empresas de telemarketing oferecendo produtos ou serviços.

A iniciativa é similar à Do-Not-Call List norte-americana, administrada pela FTC, que instituiu uma espécie de opt-out para o marketing telefônico.

A medida atende ao previsto na Lei Estadual 13.226/08. A Fundação Procon-SP elaborou uma cartilha para orientação dos interessados.

Liminar impede instalação de rastradores em veículos e o projeto SINIAV enfrenta seus primeiros obstáculos

A implementação do projeto SINIAV parece ter sofrido seu primeiro revés judicial. Uma liminar concedida pelo juiz federal substituto Douglas Camarinha Gonzales, da 7ª Vara Cível Federal de São Paulo, retira a obrigatoriedade da instalação de chips RFId nos automóveis novos pelas montadoras brasileiras, prevista pela Resolução n. 245 do CONTRAN.

A liminar fundamenta-se no fato de que o sistema armazena a rota seguida pelo veículo em um banco de dados central, que ao proprietário do veículo não é requerido o consentimento para o funcionamento do sistema e que ocorre uma venda casada no momento que o sistema é vendido ao condutor (já que trata-se de um rastreador e um mecanismo anti-furto).

Destaque-se que a liminar é extremamente feliz ao ponderar, no momento em que verifica os efeitos do sistema, as liberdades fundamentais individuais que o sistema desconsidera – a privacidade, principalmente – com os eventuais benefícios trazidos pela sua implementação, concluíndo pela primazia dos direitos consitucinais do indivíduo.

A íntegra da decisão encontra-se disponível no site da Justiça Federal/SP

União Européia sugere maior atenção à privacidade nas relações de consumo

Em duas diferentes ocasiões, a alta burocracia da União Européia anunciou em alta voz reconhecer a importância do estabelecimento de níveis de privacidade nas relações de consumo compatíveis com o desenvolvimento dos mercados.

Entre outros pontos destacados, chama atenção o disgnóstico de que seria necessária uma mudança e atualização do paradigma de proteção da privacidade do consumidor: não é necessário somente garantir que o consumidor não seja involuntariamente identificado pessoalmente ou associado sem seu conhecimento a um endereço de IP, por exemplo, porém torna-se mais e mais premente a regulação de novos métodos estatísticos que realizam a publicidade com base no interesse mesmo sem a identificação real da pessoa a quem é dirigida a publicidade. Mesmo reconhecidos diversos méritos da customização desta modalidade de publicidade, é também verdade que a possibilidade de discriminação e restrição do acesso ao mercado por meio destas ferramentas é real e necessita ser levado em conta pelos reguladores.

Estas mencionadas declarações são: (i) a apresentação da Comissária da União Européia para Assuntos de Consumo, Meglena Kuneva, em uma mesa redonda sobre obtenção de informações on-line, e (ii) a mensagem semana da Comissária da União Européia para a Sociedade da Informação e Mídia, Viviane Reding.

Tentadoras oportunidades para o uso de dados pessoais

Duas novas possibilidades de utilização das informações pesoais passaram a ser consideradas com força nos últimos dias no Brasil. Ambas se caracterizam como idéias aparentemente simples e marcadas por boas intenções, embora carreguem altas doses de abusividade na utilização de dados pessoais.
Em primeiro lugar, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro colabora na preparação de projeto de lei a ser apresentado ao Congresso Nacional pelo qual as operadoras de cartão de crédito seriam obrigadas a comunicar às “autoridades” toda compra de produtos ou serviços que possam estar relacionados ao abuso sexual de crianças e adolescentes.
Em outra iniciativa, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) anunciou que, a partir de 1˚ de julho, publicará em seu site na Internet a lista de devedores de impostos federais sob cobrança na justiça. O volume deste passivo corresponde a cerca de R$ 651 bilhões, devidos por aproximadamente 2 milhões de pessoas, o que parece justificar aos idealizadores da medida uma prática que, muito provavelmente, será questionada em nossos tribunais como uma forma de constrangimento para obtenção de cobrança.
A desproporcionalidade de ambas as medidas evidencia-se à medida que lembramos que outras fontes de dados, como a nota fiscal eletrônica, por exemplo, contém hoje informações excessivas em relação à finalidade que delas se espera – e que não é necessário eperar muito para que uma utlização “nova” seja encontrada para estas informações.

Ação Civil Pública contesta o Sistema de Identificação Automática de Veículos

O Ministério Público Federal, através do procurador Marcio Schusterschitz da Silva Araújo, ajuizou Ação Civil Pública contestando a resolução 245 do Contran, que institui a obrigatoriedade do monitoramento dos automóveis brasileiro através de chips RFId.

Como fundamento da ação, foram ressltados os fatos de que o sistema permite o monitoramento “ulta-intrusivo” das movimentações do veículo, diminuindo a garantia de privacidade de seu condutor.

Também recebeu destaque o fato de que o sistema é compulsório, eliminando qualquer possibilidade de escolha por parte do condutor do veículo, segundo segue:

“(…) a simples potencialidade associada a um chip de rastreamento por si só já é contrária à expectativa de privacidade da pessoa, incômoda à sua liberdade e capaz de “resfriar” seu comportamento. A imposição governamental de uma condição de carregador obrigatório de instrumento de rastreamento já ofende a naturalidade e o desembaraço da pessoa em sua vida privada.”